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Batalhas da rima: ritmo e poesia na cena hip-hop

  • Foto do escritor: Yara Medeiros
    Yara Medeiros
  • 24 de nov. de 2022
  • 5 min de leitura

Atualizado: 3 de dez. de 2022

Na Beira-Rio, rappers se reúnem para expressar ideias pela música


Ana Beatriz Ibiapino

Brenda Lima

Enia Luiza de Lima

Juliana Santana

Muitos jovens que se sentiam deslocados são acolhidos nas Batalhas da Marola. (fonte: divulgação)


Bastam uma caixa de som, um beat, um microfone e uma plateia animada para dois MC´s (mestres de cerimônia) se enfrentarem em uma “batalha de rima”. O movimento cultural é uma das manifestações da cultura hip-hop, que surgiu nas periferias de Nova York (EUA) nos anos 1970. No Brasil, eventos como esse tornaram-se mais comuns a partir de 1990, a princípio em São Paulo e no Rio de Janeiro.


Com a expansão, já nos anos 2000, passaram a reunir jovens como o rapper Emicida, que começou a sua carreira enfileirando rimas desnorteantes na Batalha do Santa Cruz, em São Paulo. Em Imperatriz, iniciativas semelhantes, como a Batalha da Marola, que foi criada em 2017, atraem rappers locais em ruas, praças e, principalmente, na Beira-Rio, com o objetivo de socializar e revelar talentos.


Hadriel Moura Rodrigues, rapper imperatrizense mais conhecido pelo nome artístico Rodrigues, começou a participar da Batalha da Marola em 2017, por influência de um amigo. Ele destaca que, diferente dos julgamentos que recebia em ambientes religiosos, nas batalhas se viu aceito. “Eu nunca tinha me encontrado em nenhum grupo. Quando encontrei a batalha, eu vi geral se abraçando, independente do que faziam da vida. A galera só estava ali pra ouvir a rima, então despertou meu interesse. Tinha algo de diferente ali e eu sabia que aquilo ali fazia parte de mim”.


Encontros do rap demonstram união, respeito e busca de visibilidade (fonte: divulgação).


Conhecimento e “sangue”


No geral, a batalha de rimas é um duelo entre dois MC´s que competem entre si, por meio de rimas improvisadas acompanhadas por um beat (uma batida). Dentro do movimento existem duas modalidades de batalhas mais comuns: a do conhecimento, em que os MC´s tem que desenvolver rimas inteligentes, baseadas em temas e palavras selecionadas pelo público. E a tradicional batalha de sangue, na qual o conteúdo é livre e tem por objetivo atacar e responder, a fim de desestabilizar o oponente e ganhar a aprovação da plateia. Os MC´s tem total liberdade para falar sobre qualquer assunto. Mas o interessante na batalha é o improviso feito na hora.


A batalha é dividida em três rounds. No primeiro, os competidores disputam no par ou ímpar e quem ganha escolha se vai começar ou passar a vez para o concorrente. Se o MC optar por iniciar a batalha, o adversário em seguida contra-ataca. No segundo round, os papéis se invertem: o segundo competidor inicia a rodada e outro aguarda a sua vez, tudo sendo decidido pelo público.


Caso o MC vença os dois rounds, ele ganha a batalha. Se houver empate, o público decide o melhor da rodada em um terceiro round. Muito além de atacar o concorrente, o objetivo maior do participante é ser aclamado pela plateia, conseguir arrancar gritos das pessoas e rimar de forma inteligente, sendo proibidas ofensas diretas aos familiares do adversário.


Rimas e vivências


As experiências de vida de quem está rimando ajudam no processo de elaborar versos em questão de segundos. “Se você estudar um conteúdo, obviamente você vai usar isso na rima”, explica Rodrigues. Quanto ao conteúdo das letras, ele entende que as rimas refletem a própria liberdade de pensar de cada um dos Mc’s. “Claro que dentro disso, tem a métrica, que é toda a matemática por trás da rima e dos instrumentais utilizados, tanto em batalhas, quanto em improviso livre”, destaca.


Assim como Rodrigues, João Lucas Ferreira, conhecido como JF, também já participou de diversas batalhas na cidade. Ele começou a fazer rimas ainda criança, na rua e na escola, por influência de um vizinho. JF enfatiza que esses eventos dão sentido à sua vida. “Eu amo fazer isso. Se eu parasse eu acho que eu não seria a mesma pessoa que sou. Eu faço isso toda hora, batalha é algo muito de paixão”.


Outro rapper, o Raffa, que se define como "militante desta cultura", explica que a pandemia da Covid-19 afetou bastante os encontros na Beira-Rio, mas informa que a cena está voltando a se reunir. "Hoje, em média, o movimento ficou muito fraco devido, também, à falta de apoio e incentivo do governo", comenta. Raffa garante, no entanto, que "o rap de Imperatriz não morreu, só está nascendo uma nova geração".


Alter ego


Outro rapper, Filipe Vieira, que se apresenta como EuLírico, além das rimas, também tem produzido trabalhos musicais independentes. Ele já participava das batalhas em Imperatriz desde os 15 anos e tem hoje quatro singles lançados no Spotify, “Ponta de lança” e “Febre do ouro”, de 2020 e “Tudo lento” e “Foca em mim”, de 2021, além de uma produtora, a WRLD Rec.

Eu-Lírico diz que criou alter ego para virar referência (fonte: divulgação).


Eu-Lírico lembra que desde criança sempre foi apaixonado pelo rap. “Eu escutava a batida e já ficava doido, passava o dia inteiro repetindo com minha boca a batida. Então eu me tornei um cara que curte muito o ritmo e o rap é justamente isso: ritmo e poesia”. Sobre utilizar uma outra personificação, um alter ego, o jovem afirma que esta é uma característica dos artistas de rap. “É como se ele fosse viver uma outra vida, que ele queria viver além dessa vida que ele vive. A gente cria um alter ego que possa virar referência para outras pessoas”, diz Eu-Lírico. O rap sempre significou escape e identificação em sua vida.


“Foi uma forma de poder me expressar. Sempre fui muito introvertido, mas quando se trata de rap consigo me soltar num potencial enorme”.


A união das vozes e o grito expressivo nas batalhas são momentos nos quais os corações dos rappers entram em sintonia com o som e o mesmo sonho. “A pessoa que entra aqui sai transformada. A tímida sai extrovertida, a violenta sai com mais calma, respeito e compreensão, porque ela vai se colocar no lugar do próximo’’, comenta Eu-Lírico. Segundo o MC, a batalha de rap ensina aos jovens o valor da disciplina, desenvolve o raciocínio, a comunicação e a melhor organização para a vida.


EuLírico ressalta que as batalhas podem revelar novos caminhos para muitos jovens talentos. Porém, frisa que não há nenhum tipo de apoio por parte da prefeitura e de outras instituições. E ainda enfrentam o preconceito da população.


Ele também começou fazendo rimas na escola com os amigos e hoje costuma participar de batalhas na cidade. E enfatiza a importância delas: “A gente se sente vivo! Muitos têm uma vida assim, parece que tá morta, mas quando ele vive o estilo de vida que ele queria viver com o alter ego, é quando ele começa a sentir amor pela vida”.

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2022 - Zine Sibita. Revista Cultural dos Estudantes de Jornalismo - UFMA - Imperatriz.

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