Biografias do universo musical

Cinco livros sobre músicos que enriquecem nosso repertório

Nayra Moraes

Há um universo de histórias que pode ser desbravado por meio do trabalho investigativo de jornalistas e escritores, que buscam explorar uma riqueza de acontecimentos para além dos espaços dedicados aos jornais e revistas. Com a vontade de contar histórias sem a necessidade de limites de páginas, esses profissionais se aventuram nos livros-reportagem.

Esses livros trazem análises aprofundadas sobre pautas importantes e de relevância, apresentando histórias e personagens reais com sensibilidade, empatia e honestidade.

Convidamos o pesquisador doutor em Comunicação pela Universidade Federal de Pernambuco, e professor do curso de Jornalismo da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), em Imperatriz, Alexandre Maciel, que possui como objeto de estudo o livro-reportagem, para indicar cinco biografias com temáticas culturais para aqueles que desejam se aventurar e agregar mais conhecimento.

Ele optou por centrar as suas recomendações em biografias bem recentes de músicos brasileiros e considera que são ótimos livros para quem quer ter um mergulho inicial no universo do livro-reportagem voltado para os temas culturais.

1. Meu nome é Ébano – A vida e a obra de Luiz Melodia, de Toninho Vaz (2020)

“A biografia de Luiz Melodia, artista que pelo próprio nome já dava conta do seu universo artístico múltiplo, que apostava no blues, no samba, nas variações concretas da música brasileira”, explica o professor Alexandre Maciel. Nascido no morro de São Carlos, Rio de Janeiro e tendo convivido intensamente com o artista plástico Hélio Oiticica e os poetas Waly Salomão e Torquato Neto, o músico foi revelado no cenário nacional com a gravação da canção “Pérola negra”, de sua autoria, pela cantora Gal Costa, em 1971. Mesmo com o sucesso de crítica do primeiro disco de mesmo nome, lançado em 1973, enfrentou o preconceito de ser chamado de “maldito”, apesar de ter uma obra crucial para a música brasileira, com discos como Maravilhas contemporâneas (1976) e Mico de circo (1978). Segundo o professor, a biografia escrita pelo jornalista Toninho Vaz, que já tinha narrado a vida do poeta Paulo Leminski, no livro O bandido que sabia latim, trata de mais um artista brasileiro que vem sendo redescoberto pelo público jovem mais antenado, graças à era dos streamings de música. “Vale a pena ler sua vida, é um homem bastante focado na sua carreira, criativo, que prezava pela sua liberdade, não queria ser manipulado pelas gravadoras e seu protesto contra esse desconhecimento que envolveu sua obra por um tempo”, recomenda Alexandre Maciel.

Editora: ‎ Tordesilhas

Capa comum: ‎ 336 páginas

Preço médio: R$ 49

2. Ney Matogrosso: A biografia, de Julio Maria (2021)

“Uma biografia que mostra todo o preconceito que ele enfrentou por ser homossexual, a descoberta do sucesso tardio, com 30 anos, toda uma trajetória de talento, desenvolvida até seus atuais 80 anos, dando conta desse personagem ao mesmo tempo misterioso e exuberante que é o Ney Matogrosso”, define o professor Alexandre Maciel. O jornalista Júlio Maria, que já havia chamado atenção com a biografia da cantora Elis Regina, Nada será como antes (2015), investigou a vida do intérprete por cinco anos, desde as suas origens, em Bela Vista, Mato Grosso do Sul, quando já enfrentava a rígida educação paterna. Detalha novas descobertas sobre o período em que Ney Matogrosso estourou, com a banda de curta duração, mas sucesso absoluto, Secos e Molhados, em meados dos anos 1970. “E aprofunda toda trajetória marcada por espetáculos que sempre se destacaram pelos cenários e figurinos, além da escolha de repertório e explosão artística do cantor”, como explica o professor. Outros momentos marcantes da biografia destacados por Alexandre Maciel são o namoro com o cantor e compositor Cazuza e o triste período em que vários de seus amigos, entre artistas, produtores e cantores de renome, faleceram por consequência de complicações da Aids.

Editora: ‎ Companhia das Letras

Capa comum: ‎ 512 páginas

Preço médio: R$ 49

3. Roberto Carlos outra vez (1941-1970)- Volume 1, de Paulo Cesar Araújo (2021)

“A biografia, em seu primeiro volume, dá conta do universo desse grande artista popular de 1941, seu nascimento, até 1970, quando ele começa enveredar pela black music e por outras sonoridades. Antes, aborda o sucesso do movimento Jovem Guarda, nos anos 1960 e narra o duro caminho do artista até chegar ao sucesso estrondoso”, como explica o professor Alexandre Maciel. É bom lembrar que o jornalista Paulo Cesar de Araújo tentou lançar uma biografia sobre o cantor e compositor em 2006, Roberto Carlos em detalhes, que foi praticamente censurada pelo “rei”. “O cantor entrou na justiça, ganhou dinheiro em cima do autor e conseguiu a decisão judicial de recolhimento da obra. Só no final de 2017 o Superior Tribunal Federal (STF) concluiu, em votação no plenário, que uma pessoa pública pode sim, em termos da Constituição, ser abordada por uma biografia sem autorização prévia”, detalha o professor. Paulo Cesar reformulou então a biografia e, em sua nova versão, apresentou o conceito de cada capítulo, de um total de 50, ser dedicado à história de uma música composta ou interpretada por Roberto Carlos que teve relação direta com a sua vida. “Então, por exemplo, o acidente que ele sofreu perdendo um pedaço da perna na beira de um trilho de trem, ainda na infância, em Cachoeiro de Itapemerim, abre o livro, justamente com as referências que o compositor deixou de forma subjetiva na canção ‘O divã’, gravada em 1972”, exemplifica Alexandre Maciel.

Editora: ‎ Record

Capa comum: ‎ 700 páginas

Preço médio: R$ 40

4. Amoroso-uma biografia de João Gilberto, de Zuza Homem de Mello (2021)

"A biografia de João Gilberto dá conta de um dos pais da Bossa Nova desde quando ele criou, a partir de uma série de influências, a famosa batida de violão. Detalha o seu sucesso internacional e segue até os momentos finais da vida dele, quando a filha e também cantora Bebel Gilberto teve que pedir para cuidar de sua rotina e das suas finanças via decisão judicial, porque ele já estava em um afastamento social grave”, explica o professor Alexandre Maciel. João Giberto sempre foi marcado pela personalidade excêntrica e, ao mesmo tempo, genial. O pesquisador musicólogo Zuza Homem de Mello, um dos maiores do Brasil, que faleceu em outubro de 2020, deixando o livro concluído, oferece aos leitores uma biografia afetuosa, justamente por ter conhecido e convivido com João Gilberto. Assim, segundo Alexandre Maciel, o autor consegue detalhar algumas manias que o cantor mantinha, como a de fazer ligações telefônicas intermináveis para os seus amigos em plena madrugada, recolhido em seu apartamento no Rio de Janeiro. Além de apontar as curiosidades de bastidores de suas célebres turnês por vários países do mundo, como Estados Unidos e Japão, nas quais costumava ser muito rigoroso com a qualidade de som, a necessidade de silêncio total da plateia e até com a temperatura do ar-condicionado.

Editora: ‎ Companhia das Letras

Capa comum: ‎ 344 páginas

Preço médio: 57,50

5. Viver é melhor que sonhar – Os últimos caminhos de Belchior, Chris Fuscaldo e Marcelo Bortoloti (2021)

“Como o nome indica, esses dois jornalistas resolveram seguir os últimos passos do cantor e compositor Belchior. Ele abandonou a carreira artística em 2007, aos 60 anos, e ficou alguns anos, até a sua morte, em 2017, perambulando em companhia de sua última esposa, Edna Prometheu, deixando um casamento de 35 anos e os filhos com pagamentos de pensões alimentícias atrasados. Virou um grande mistério por onde caminhava Belchior nesse tempo todo e o que ele fez”, contextualiza Alexandre Maciel. O livro resgata esse período, passando por todos os hotéis e lugares diversos que ele esteve, para entender as motivações que levaram a Belchior a seguir esse caminho de recolhimento, que termina com ataque cardíaco fulminante. Os autores visitaram hotéis e casas de pessoas que o abrigaram em Montevidéu e Artigas, no Uruguai, Porto Alegre e Santa Maria, no Rio Grande do Sul, São Paulo, Sobral (CE), até chegar ao seu último endereço em vida, escondido no pequeno município gaúcho de Santa Cruz do Sul. “Ao mesmo tempo, o livro mostra a importância da música do Belchior e como, mesmo desaparecido, ele continua bastante famoso no Spotify e entre outros streamings e sua obra vem sendo cada vez mais redescoberta pelos jovens”, ressalta o professor.

Editora: ‎ Sonora Editora

Capa comum: ‎ 260 páginas

Preço médio: R$ 45,60