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"Proposta do AnimaCon é dar entretenimento aos jovens"

Criador do evento, Jader Moreira, conta como é empreender na área da cultura nerd geek em Imperatriz


Clara Teles


Animes, séries, filmes, trilogias, role-playing games (também chamados de RPG), doramas, histórias em quadrinhos, jogos, adaptações, cosplay. Todos esses e diversos outros meios de entretenimento fazem parte da cultura nerd geek. Em Imperatriz, a cultura geek demonstra força, mas empreender no campo não é fácil. Para Jader Moreira, produtor cultural do AnimaCon, o maior evento da área promovido na cidade e região, o mercado evoluiu desde que começou, mas ainda enfrenta o pouco reconhecimento e vários desafios. Diante das dificuldades de conseguir patrocínio, ele se apega a um lema: “Quem não caminhou comigo na minha luta não pode estar bebendo da minha glória”.


Nascido em Riachão, cidade do sul do Maranhão, o produtor cultural também é cinéfilo e amante da cultura geek desde criança. Quando se mudou para Imperatriz, em 2012, buscava novas oportunidades e percebeu um meio de juntar o entretenimento, a cultura e o mercado criando o AnimaCon. O evento, anual, ocorre na cidade há 10 anos e busca estimular o reconhecimento do universo nerd geek na região Tocantina do Sul do Maranhão.


Com a experiência de anos produzindo o evento, Jader já consegue traçar um perfil do público e do potencial comercial do mundo nerd geek. O que antes era mais uma brincadeira, com pouca expectativa e experiência, tornou-se um dos eventos geeks mais esperados pelos consumidores desta cultura em Imperatriz. Apesar da popularidade ter crescido, a incerteza da realização do AnimaCon, a cada ano, ainda é um obstáculo. Estrutura, local, mobilização e muito mais são questões a se avaliar quando se pensa na organização de um evento como este. Em uma conversa com o Zine Sibita, Jader apresenta a sua perspectiva a partir das vivências no universo geek em Imperatriz.


Zine Sibita - Como aconteceu o seu interesse pela cultura geek?

Jader Moreira - Desde criança, porque na década de 1990 eu já tinha cinco anos e o Brasil estava explodindo com os seriados, otakus [fãs da cultura pop japonesa] e o que eu mais assistia eram os seriados japoneses chamados tokusatsu [séries com heróis, monstros e efeitos especiais, como Jaspion]. Eu não sei se você já ouviu falar, eles que deram origem aos Power Rangers, os americanos, mas a cultura japonesa já veio desde cedo. Então isso foi me transformando num cinéfilo também e, a partir do momento que comecei a ter acesso a esse tipo de conteúdo, fui criando gosto também por filmes.


Z.S.- Conte um pouco de como surgiu a ideia de promover eventos focados no meio geek.

J.M.- Foi muito engraçado. Cheguei em Imperatriz em 2012, morava em Riachão, uma cidade do sul do estado, e aí precisava criar alguma ideia e dar uma virada de chave na minha vida. E foi onde disse: “Vou fazer um evento de anime, a cidade é grande”. Nosso primeiro evento foi aberto no Tocantins Shopping e deu três mil pessoas. Então foi uma baita surpresa pra gente, que tinha esse público todo aqui na cidade.


Z.S.- Vocês já tinham expectativa desse grande público?

J.M.- Não, até porque a gente não entendia o público ainda. Foi uma experiência que o shopping apoiou e ficou com muito medo, porque quando ia abrir, o evento começava às dez da manhã, já tinha muita gente lá fora querendo entrar e a gente: “Meu Deus, o quê que tá acontecendo?”. Mas foi maravilhoso, isso deu para gente mapear muita coisa e entender o que estava acontecendo para os evento futuros.


Z.S.- Do primeiro evento, que aconteceu em 2012, até hoje, o que você acha que mudou?

J. M.- Mudou a exigência dos nossos clientes, dos nossos visitantes. Eles sempre queriam algo mais, atrações, novas ideias. Foram inseridos vários outros projetos dentro do AnimaCon, como card game [jogos de cartas personalizados e de estratégia] e K-pop [música pop coreana]. A gente trouxe um swordplay, que é uma luta medieval. Então a gente teve que trazer coisas de fora pra poder complementar o nosso evento. Só lembrando que o evento tem pouco apoio, então a gente tem que cobrar entrada para poder custear.


Registro de 10 anos de AnimaCon: cosplayers disputam em criatividade. (foto: Karymidon)


Z.S.- Você poderia destacar os momentos mais marcantes desses 10 anos de eventos?

J. M.- Eu tenho um evento que particularmente é o que eu mais gosto: foi em 2013, o AnimaCon especial de Natal. A gente conseguiu trazer os cosplays [pessoas que se fantasiam de personagens] lá do Rio de Janeiro, com as roupas do Star Wars. Botamos uma orquestra no meio do Tocantins Shopping, tocando temas de filmes, séries e animes, e a arte imperial do Darth Vader. Foi um momento muito bom, mas muito difícil. Para mim é o melhor evento, foi lindo demais ver tudo isso. Teve também o que foi a primeira edição do projeto. A gente trouxe os irmãos Piologo [criadores do site de animações Mundo Canibal]. Depois conseguimos trazer um músico muito massa, Ricardo Juno, que toca vários temas, e hoje está com o Dragon Ball, na GloboPlay. A gente conseguiu trazer também o [dublador brasileiro do] Vegeta [personagem do Dragon Ball], que é o Alfredo Moro. Trouxe o Muca Muriçoca [o criador do canal do You Tube Muca TV, Murilo Cervi], que foi incrível. Consegui trazer, ano passado, o Wendel Bezerra [dublador de Bob Esponja e do personagem Goku, da franquia Dragon Ball]. Fomos moldando de acordo com o que as pessoas estavam querendo, trazendo para apreciar os seus personagens preferidos. Para mim, foi uma evolução muito grande trazer atrações nacionais nesses eventos, porque Imperatriz é longe da capital. E tudo se torna dispendioso. Então a gente bota pra correr, para poder tentar construir sempre o melhor para os visitantes.


Edição especial de Natal do Animacon 2013: grande atração foram os cosplayers de Star Wars. (foto: arquivo AnimaCon)


Z.S.- Como está a preparação para a edição deste ano, que é a 11ª? Tem alguma novidade que possa revelar agora?

J. M.- A edição está em stand-by [em modo de espera] por conta do patrocínio. A gente contava com uma lei de incentivo chamada Paulo Gustavo, mas o nosso poder público é muito atrasado. [A prefeitura de Imperatriz lançou o edital, com três linhas de fomento, no dia 9 de novembro de 2023 e esta entrevista foi feita em outubro]. Um evento desse porte custa, em média, R$ 50 mil e a gente estava contando com essa lei, então ainda não consegui. Mas, de antemão, a ideia do evento é trazer alguém de One Piece [anime transformado em série live action em 2023], porque o hype do anime tá muito alto. E a gente sempre quis trazer a Carol [Valença], que é a dubladora do [Monkey] Luffy, [da franquia One Peace]. Eu a conheci lá em Brasília em um evento que fui, e ela é maravilhosa, super solícita e gente boa. Então, assim, a gente está aguardando pra fazer um negócio bem bacana. E com o incentivo da lei, a gente não cobraria entrada. Seria uma entrada social, um quilo de alimento não perecível, algo voltado pra isso.


Z.S.- A cultura nerd geek em Imperatriz tem algum destaque? Jogos, histórias em quadrinhos, cosplay?

J. M.- Olha, o pessoal gosta de board games [jogos de tabuleiro], card games, mas a gente sabe que eles se animam muito em fazer cosplay. Eles têm esse amor pelo cosplay e as pessoas amam ver os cosplays. Eu falo que os cosplays são um evento dentro do evento. Então assim, pra mim é o que mais se mobiliza pra fazer. Mas tem a galera do K-pop, também, que é muito forte aqui na cidade.


Z.S.- Realmente, nesses últimos anos, o K-pop veio com força para o Brasil e para Imperatriz. Quando se fala em dorama [séries dramáticas japonesas com episódios semanais], então...

J. M.- Ah, eu amo dorama, eu amo.


Z. S.- Tá vendo? Mais um fã. Então, você poderia falar um pouquinho sobre o que você acha do perfil do público nerd aqui de Imperatriz e da região Tocantina no sul do Maranhão?

J. M.- Olha, o pessoal da cultura geek aqui é muito bacana, é um pessoal que é adepto. O problema é que não tem incentivo para divulgar mais ainda os projetos. Agora mesmo, o Centro Cultural Tatajuba me deu o espaço para a gente montar algumas oficinas voltadas para o público. Eu tô com o pessoal aí no Yu-Gi-Oh, que eu não sei se você conhece, mas é um RPG que também virou anime. E aí vamos montar umas oficinas, mas a gente queria que outras pessoas fizessem mais coisas. Hoje em dia só tem dois grupos que trabalham o segmento geek na cidade, e é um segmento muito forte. O meu medo é a gente trabalhar muito e chegar um empresário com grana e só colher os frutos. Porque a gente trabalha, divulga, faz tudo e sempre vai ter um que só vai chegar: “Ah, aquele público ali, eu vou pegar ele pra mim”. E pega.


Z.S.- E o AnimaCon hoje é muito mais que apenas um evento. A partir dele você conseguiu entrar no empreendedorismo e criar sua própria empresa. Como é ser empreendedor nessa área aqui em Imperatriz pra vocês?

J.M.- Olha, é bem difícil, viu? Porque assim, tem muita gente que poderia te dar uma mãozinha pra te botar lá, te ajudar, e não tem nenhum interesse. Mas quando te vê na TV, aí quer ficar perto para poder colher um fruto que pode gerar daí. É que nem aconteceu com a Fadinha [Rayssa Leal, imperatrizense, campeã mundial de skate]. Eu sei que tu sabes a história. A Fadinha batalhou, batalhou inteiramente, ninguém apoiava. Hoje, todo mundo quer colar na Fadinha porque ela é estrela internacional. Eu falo assim: quem não caminhou comigo, na minha luta, não pode estar bebendo da minha glória. Eu tô buscando apoio de uma pessoa aqui da nossa região para tentar contato com a ministra da Cultura, [Margareth Menezes], em Brasília, pra gente ir lá apresentar o universo geek pra ela. E essa pessoa não tá nem dando bola. Eu falo, pô, e se eu tivesse nessa posição? Claro que eu ia colocar as pessoas da minha região, né? Entender o projeto, como é que é, ver se é viável e levar pra pessoa poder apreciar. Ninguém tá pedindo nada, ninguém tá pedindo dinheiro. A gente tá pedindo pra que se crie um estudo para acolher o segmento no Brasil. É um segmento muito forte. Olha, hoje em São Luís, amanhã quer dizer [14 de outubro], vai acontecer o maior evento para o Maranhão, Matsuri [com atrações e atividades Geek, Otaku e Gamer]. E o cara trabalhou 10 anos para fazer um negócio que hoje é nível nacional. Assim, para a gente do segmento geek-nerd é difícil, porque os empresários que poderiam apoiar não apoiam. Porque aqui, não sei o que é, tem medo de alguma coisa, não sei. Mas a gente propõe fazer o AnimaCon para poder dar entretenimento aos jovens que não podem ir para fora. Por exemplo, posso ir para qualquer lugar que eu quiser assistir um evento, mas tem gente que gostaria e não pode.


Z.S.- Você acha que a cultura nerd geek terá um maior reconhecimento nos próximos anos?

J. M.- Em Imperatriz não sei, mas no Brasil ela é muito forte. Eu não sei se você conhece a Comic-Con Experience, que é a CCXP de São Paulo, é a maior da América Latina, a segunda maior do mundo. O Érico Borgo, que é o criador dela, já veio em Imperatriz. E pra você ver o tanto que essas pessoas são. Esses empresários são tão bobos, ele veio pra cá e eles não procuraram o AnimaCon. Aí, dois dias antes da palestra do Érico Borgo, um cara do Brasil no segmento geek, eles vieram procurar para poder lotar a palestra deles. Eu falei: “Mas dois dias!” O cara vendeu o site dele [Jovem Nerd] pra Magalu, por R$ 5 milhões, cinco milhões de reais! Trouxeram um gênio pra cá e não souberam explorar o que ele poderia trazer. Aí eu te pergunto: como é que a gente vai pensar no futuro? Sendo que os próprios empresários não acreditam no cara que eles estão trazendo, não sabem mapear a galera que pode absorver aqui. Eu marco um encontro bem pequeno, no Tatajuba, só para ficar brincando, não tem nenhuma atração nacional e tem mil pessoas.


Z.S.- É uma questão muito da carência do público na cidade, não é?

J. M.- As pessoas ficam carentes desse conteúdo aqui na cidade, nessas partes de cultura. E aí a pessoa não entende que não tem o que fazer. Claro! A gente está procurando entretenimento, né? Todo mundo tem direito à cultura, o que não se vê nos bairros, o pessoal procura no centro. Você pode ver quando tem show na Beira-Rio, as pessoas vão. Não é porque elas não têm o que fazer, não. É porque é só isso que tem para se fazer.


Z.S.- E falta também infraestrutura para essas pessoas conseguirem acessar isso.

J.M.- Mas aí, a galera não tá querendo beneficiar o bairro, não. Elas precisam mostrar força. Então, o que elas fazem? Fazem um evento no grande Centro, que é para captar as pessoas dos bairros e dizer assim: “Poxa, eu mobilizei tantas pessoas...”. Elas não pensam em beneficiar a Vila Lobão, a Cafeteira, eles querem mostrar que eles têm força política. Infelizmente, tudo o que se faz nas cidades é para mostrar força política.


Z.S.- E sobre o seu perfil, quais são as suas preferências no mundo geek, como fã e consumidor?

J. M.- Eu amo Harry Potter. Fui apresentado ao Harry Potter lá em 2002, por um amigo que tinha o livro e foi incrível, porque éramos três amigos. Um tinha grana, comprava os livros, lia e dava pra gente ler. Quando comprei o meu primeiro livro, em 2006, fiquei morto de felicidade. Porque assim, comprei [o último livro da série], As relíquias da morte, e foi muito top, 2006, 2007 ou 2008, não me lembro direito. Mas assim: amo os livros que viram filmes, amo essa coisa de ler, para depois assistir, para ver como é que é. Mas também gosto de animes, gosto de séries e animação. Agora mesmo eu tava assistindo de novo Trolls hunters, que são caçadores de trolls da Netflix, que é uma história incrível. Eu também gosto de Naruto. Eu estava assistindo uma série da Netflix chamada Castlevania, que é muito sanguinária, mas é muito boa a história, tem umas artes muito boas. Então só vou absorvendo. Agora eu coloquei dorama nas minhas preferências, porque eu assisti um chamado Celebrity, que é de uma menina que vira digital influencer, ela vê a podridão do meio, e começa a expor essas coisas, mas é muito legal. Eu também me apaixonei pelo dorama chamado Sorriso Real. É sobre a história de uma menina que vai trabalhar no hotel, o diretor acaba se apaixonando por ela e tal. Então eu acredito que o universo geek só vem pra gente absorver coisas boas, né? E a gente consegue transformar também muitas vidas. Tem gente que abriu empresas para poder atender o segmento de Imperatriz e hoje segue muito bem-sucedido.


AnimaCon foi ganhando proporções maiores a cada edição. (fotos: Karymidon)




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